"Entraram para a taverna, e o vendeiro acendeu a luz.
O Isidro foi direito ao balcão e, nos grandes jeitos de paz ou guerra, propôs:
– Para não gastar mais água na boca, racha-se a diferença, quer?
A cabeça pitoresca do taverneiro torceu-se duas vezes na mesura dos lances aventurosos, esbeiçou os lábios, anuiu. Apressou-se o almocreve a selar o contrato com uma jura honrada de negociante:
– É por ser para quem é, negro eu seja se tiro um puto real!
Deitou-se num prato um fio de azeite para prova. A faiança coloriu-se de oiro, doirado ficou o cavaleiro verde na verde historiação dos oleiros. As pessoas que estavam molharam o dedo e levaram à língua. E, entre tantos de palato gozoso, só o homem das vacas, para agradar ao senhor da taverna, pôs pecha:
– Sempre lhe digo que o outro não era lá grande fazenda.
O Isidro, que havia ganho uns cobres, complacentemente respondeu:
– Este não há-de ser pior. Mas tomara eu ter a alma tão pura como era o outro."
Passagem retirada do conto À Hora de Vésperas, inserido no volume intitulado Jardim das Tormentas (1913), de Aquilino Ribeiro (1885-1963).
O referido "cavaleiro verde" alude indubitavelmente ao motivo Estátua (Cavalinho), comum quer na produção da FLS quer na de outras fábricas portuguesas (cf. http://mfls.blogs.sapo.pt/tag/motivo+est%C3%A1tua).
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