Diferente perspectiva de uma decoração a stencil (chapa recortada) em taça saladeira já reproduzida anteriormente (http://mfls.blogs.sapo.pt/40274.html).
A decoração radiante, evocativa da sol, das estrelas, da electricidade, e mesmo das vibrações sonoras e musicais, foi um tema recorrente ao longo do período Art Déco nas mais diversas áreas das artes decorativas e da arquitectura sendo, na cerâmica, comum a várias fábricas europeias e americanas.
Conforme referido em artigos anteriores, há notícia de técnicos provenientes da fábrica alemã Schramberg (SMF) terem vindo trabalhar, ocasionalmente ou em definitivo, para a FLS a partir da década de 1920. Terá sido esse o caso do abridor de chapas (stencil) Joseph Clemens (datas desconhecidas), que trabalhou na empresa entre 1926 e 1971.
Também de origem alemã eram o chefe forneiro Franz Altenbaumker (datas desconhecidas; trabalhou na FLS entre 1927 e 1936), o pintor sobre vidro Bernard Gusgen (datas desconhecidas; 1924-1927), o pintor sobre biscoito Karl Huber (datas desconhecidas; 1932-1969), o técnico de mosaicos Kortch (datas desconhecidas; 1924-1928) e o pintor sobre biscoito Wilhelm Wagner (datas desconhecidas; 1928-1945). Estes nomes constam de uma lista dactilografada elaborada pela secretaria-geral da fábrica em 5 de Abril de 1971, e actualmente depositada no CDMJA, pelo que é possível que a transcrição onomástica não seja completamente exacta.
A empresa de faiança Schramberger Majolika Fabrik empregou nas décadas de 1920 e 1930 diversos artistas que imprimiram um cunho de modernidade à sua produção, quer a nível das formas, muitas vezes influenciadas pelas linhas depuradas da Bauhaus, dos Construtivistas, dos Suprematistas e do movimento De Stijl, quer a nível da decoração, como exemplificado por este prato (pode ainda ver-se uma pequena jarra desse período da SMF aqui: http://mfls.blogs.sapo.pt/40059.html).
Entre os grandes designers que colaboraram com a fábrica conta-se a artista de origem húngara Eva Zeisel (nascida Eva Amalia Striker, ou Stricker, em 1906), a qual esteve na empresa desde 1928 até 1930, período em que criou mais de 200 formas e decorações para a SMF. Mudando-se para a União Soviética em 1932, colaborou com as célebres fábricas russas Lomonosov e Dulevo, vindo a ser nomeada directora artística da indústria de cerâmica e vidro da URSS em 1935.
No ano seguinte, contudo, acabou por ser presa sob acusação de conspirar contra Estaline (1878-1953) e o Estado. Libertada em 1937, partiu para a Áustria, de aí para Inglaterra, onde casou em segundas núpcias com Hans Zeisel (datas desconhecidas), e posteriormente para os E.U.A., onde chegou em Outubro de 1938. Nesse país as suas competências técnicas e artísticas depressa contribuíram para que obtivesse emprego, vindo o reconhecimento do seu trabalho a proporcionar-lhe colaboração com diversas empresas cerâmicas, como a Castleton, a Hall China e a Red Wing, entre muitas outras. Aclamada ao longo de décadas, Eva Zeisel tem-se mantido activa como designer até à presente data.
Lucie Young, Eva Zeisel (2003).
Em Portugal o seu trabalho encontra-se representado através do canjirão "Machado", que a Vista Alegre produziu em porcelana a partir de 1938. Embora não se encontre assim creditado nos arquivos da VA (nos verbetes da fábrica, a única anotação manuscrita sobre os dados históricos da peça refere ter sido este modelo dado [sic] por Machado dos A.), o formato corresponde a uma peça criada por Zeisel para a SMF em 1929 ou 1930. Um exemplar deste canjirão da VA, com a inscrição "Recordação de Braga" e uma imagem do Santuário do Sameiro, foi exibido na exposição Portuguese Ceramics in the Art Deco Period, realizada em 2005 nos E.U.A.
Nos arquivos da VA encontra-se ainda o registo de uma cafeteira, "Primavera", e respectivo serviço complementar, produzida a partir de 1961, cuja autoria é atribuída a "Mme. Stricker" [sic]. O seu perfil não corresponde às formas curvilíneas e arredondadas que predominam nas peças de Eva Zeisel, mas é possível que este serviço seja de sua autoria, pois Zeisel voltou a colaborar com diversas fábricas europeias, entre as quais a Rosenthal, a partir de 1958.
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