Um 25 de Abril adiado…
Em 1970 a Sacavém lançou na Feira Internacional de Lisboa uma novidade. Tratou-se de um lavatório de embutir sob um tampo de mármore e com um armário por baixo. Para além do efeito estético, este último servia para esconder a canalização.
No dia da inauguração, como era hábito, todos os stands estavam atrasados na sua preparação. Um pouco antes da chegada do Almirante Américo Thomaz (1894-1987; presidente, 1958-1974), o Presidente da República na altura, ainda estávamos a tratar dos acabamentos finais. No entanto, e para grande satisfação nossa, quando ele finalmente chegou ao nosso stand demos um grande suspiro de alívio pois, pensávamos nós, estava tudo pronto. Afinal de contas…
O Presidente, ao chegar ao stand da Sacavém, olhou para o lavatório e disse: “Olha que interessante, a Gertrudes vai gostar imenso desta ideia”. Claro que fiquei muito satisfeito com este elogio, mas qual não foi o meu espanto quando, logo de seguida, ele se baixou e tentou abrir a porta do armário existente sob o lavatório. É que, afinal de contas, não lhe interessava nada (nem possivelmente à sua esposa Gertrudes) a nossa grande novidade na Feira, o lavatório de embutir, mas sim o armário!
Logo após deu-se uma situação que poderia ter tido graves consequências para a Sacavém (neste caso para mim, pois eu estava ali como administrador, representando a empresa) e possivelmente para o país. Ao tentar abrir a porta, o Presidente puxou pela maçaneta que se soltou uma vez que, com a pressa, não a tínhamos fixado devidamente. O Presidente desequilibrou-se e caiu para trás, desamparado, vindo contra mim.
Até então, nada de muito grave se passara, mas nós tínhamos ainda em exposição uma linha de lavatórios colocados defronte da tal bancada. Caí também para trás, com o peso do Presidente em cima de mim, e bati com as costas num outro lavatório. Ainda hoje sofro com as sequelas daquele acidente, mas assim acabei por evitar que, possivelmente, o Presidente batesse com a cabeça no lavatório, impedindo que lhe acontecesse o mesmo que ao Presidente do Conselho de Ministros, Dr. Oliveira Salazar (1889-1970), dois anos antes.
Será que involuntária e inadvertidamente adiei um 25 de Abril?!
© Clive Gilbert
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